
Adoro o jogo e tremo ante o mistério, mas mistério é o nome do jogo.
Adoro o jogo e tremo ante o mistério, mas mistério é o nome do jogo.
Sobre a Minha Cidade
Até ao dia 18 do corrente, houve mais ocorrências do que em igual período do ano passado, sendo importante notar que diminuiram os fogachos (fogos que consomem menos de um hectare) e aumentaram os incêndios florestais, aqueles que realmente destroem. Contudo, há opiniões, supostamente abalizadas, que menorizam tal circunstância, referindo que o período realmente crítico de 2003 não foi esse. Pelos vistos, sabem consultar calendários.
O problema é quando se ouve o presidente do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil a assumir um discurso de vítima, dizendo que a culpa é dos criminosos. Ou quando ele se dá ao luxo de recomendar às pessoas que não façam queimadas, quando tal procedimento é rigorosamente condicionado pela lei, uma entre muitas leis que não há maneira de fazer cumprir. O drama é sempre o mesmo. No fim, reúnem-se conselhos de sábios, elaboram-se relatórios, policopiam-se os relatórios, distribuem-se os relatórios por outros sábios ou candidatos a sábios. Os políticos terão matéria para discutir e, no ano que vem, há-de haver uma altura em que as pessoas questionarão o que está a ser feito para prevenir os incêndios. No Verão, concluir-se-á que nem tudo foi feito. No Outono os políticos discutirão o problema...
Desliza-me o pensamento entre dimensões contraditórias, voga entre o tempo e a vida, entre as oportunidades desencontradas e os momentos desgarrados. Não digo que necessitasse de um outro eu, apenas de outras circunstâncias. Às vezes. Há uma espécie de dor controlada, uma estranha tomada de consciência tirada dos instantes em que, sabendo-o, somos do que não é nosso. É como estar de pé no parapeito e conseguir um estranho equilíbrio de forças, saltando em frente e, ao mesmo tempo, a aplicar em sentido contrário a força que nos mantém numa firme instabilidade. Não se trata de qualquer estado depressivo. Não me estou a subestimar, nem aos ensinamentos do tempo que passa. É apenas uma espécie de perplexidade cómica, algo como sonhar com a chave do totoloto um dia depois de ter sido sorteada.
(alegadas irregularidades no passaporte fizeram com que Mantorras, futebolista do Benfica, fosse detido pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras)
O meu vizinho da frente chora. Sempre. Não se ouvem dele queixumes, não perde a postura altiva, apesar daquela inesgotável torrente lacrimosa. Há no choro dele uma contínua renovação, não sei se do sofrimento, se da nostalgia. Não sei se é o lamento de uma existência inalterável. Tem, por certo, mais de vinte metros de altura. É um cedro, creio, e besunta-me o carro com lágrimas resinosas quando paro à sombra dele. Domina a rua, dança com o vento, resiste à chuva. Aguenta o frio, não se esconde à sombra quando o sol o esmaga, antes prefere dar sombra aos que passam e não têm raízes. Não sei o que o faz chorar, se as raízes que o prendem, se alguma afinidade com aquele que o olha, arrancado à terra e sedento desse húmus que dá vida tanto ao choro como ao riso.
No mesmo dia, Paulo Portas elogiou a ida de Teresa Caeiro para secretária de Estado da Defesa, justificando a escolha com a pérola curricular de ser "filha e neta de militares". mas como em política o que de manhã é verdade à tarde é mentira, a senhora já é, afinal, secretária de Estado das Artes e Espectáculos. Já se desconfiava do Ministério da Cultura, mas a cereja no topo do bolo é esta: os espectáculos privilegiados pela propaganda nacional serão os "tatoos" militares. Há palhaçadas que têm pouca piada.
Isto é só para recomendar muito cuidado quando se liga o televisor, particularmente de manhã. Hoje fiz isso, talvez para ter ruído de fundo em casa, e reparei que o programa "Praça da Alegria" estava a ser feito no exterior, em Nevogilde, junto à conhecida pérgola que embeleza o passeio marítimo. Um dos convidados era um curioso cujo nome não fixei, certamente muito conhecedor das histórias da Foz, que, a páginas tantas, explicou que o Castelo do Queijo (o Forte de S. Francisco Xavier do Queijo, assim chamado por estar sobre um rochedo que era conhecido por Queijo) tinha sido erguido por influência do clero, para afastar os druidas que naquele sítio cumpriam os seus rituais. Ora, o edifício militar foi construído no século XVII, ou seja, o convidado do programa esqueceu-se de precisar que os clérigos queriam afastar os fantasmas dos druidas. Claro que desliguei o televisor. Claro que fiquei a pensar que muita gente, cuja fé na televisão é inquebrantável, está agora enriquecida com essa extraordinária "verdade histórica".
É curioso que ainda ontem passei boa parte da manhã numa deliciosa conversa, em que vieram a propósito os problemas da condição feminina através dos tempos. Problemas perenes, mais perenes do que possamos imaginar. A parte curiosa – tristemente curiosa – é que mais tarde vi um trabalho, na televisão, a propósito da violência sobre as mulheres, com especial enfoque na situação espanhola, que ganhou grande visibilidade nos últimos anos, e alguma discussão sobre a realidade portuguesa.
A coluna de links ali ao lado está a lástima do costume. Não me lembro de a actualizar, ou faço tudo por me esquecer quando tal ideia me sobe à cabeça. Mas reconheço que, mais dia, menos dia, terei de fazê-lo. Um dos novos blogues a destacar é o Dias com árvores, que teve a gentileza de mudar o url (aos info-excluídos: aquela coisa que se escreve lá em cima) para eu poder conhecer o que ali se faz. Só por causa disso, já me sentiria obrigado ao reconhecimento, mas não chega. É um blogue do Porto, com árvores. Original, bonito e útil (talvez o novel ministro do Ambiente possa aprender alguma coisa, esteja ele disposto a alguma coisa aprender).
Às vezes, resistimos a ver os sinais que se nos deparam. Tendemos a imaginar que determinadas situações são meramente ilusórias, fruto da nossa vontade, quanto mais forte esta for. É uma atitude defensiva e desconcertante. Seria melhor que nem sempre aprendêssemos com os erros.
Ao reler um texto aí para baixo, arranjei um pós-título, ou epígrafe, ou lá o que se lhe queira chamar, para a Fonte das Virtudes. Apeteceu-me.
O homem acabou de tomar posse. Tento acordar mas não consigo. Parece que é mesmo verdade.
Não foram muitos os que saudaram o meu primeiro ano de vida blogosférica, mas valeram por várias multidões. Mais distraído do que ingrato, só agora lhes deixo aqui o meu abraço de gratidão, pela ordem em que chegaram à caixa de comentários.
Completamente derretido -- pasmado, até --, fixo as formas curvilíneas que se vieram pôr à minha frente, luzidias, perfeitas, inebriantes. Não resisto a tocá-las, a cobri-las de carícias. Parece que ela gosta de mim, não pára de me olhar com ternura, deixa-se estar à minha frente quieta, serena, à espera do toque dos meus lábios. E eu gosto dela, do que aparenta e do que encerra. Para mais, consegue dizer tudo sem falar. É a garrafinha com que fui premiado, por ocasião do primeiro aniversário da versão blogue da Ânimo. Recebi-a há pouco e não resisti a levar o gargalo à boca, provando o licor de tangerina com que o António Colaço decidiu tornar os dias mais leves a cinco felizardos. É uma delícia!
Telegraficamente:
Ser português implica uma vocação marítima? A questão poderia permitir que discorresse, numa espécie de prolixidade oca, partindo do zero para chegar ao vazio, isto é, sem perceber o que é isso de ser português ou que diabo é a vocação marítima. Portanto, há que simplificar. Presumo que não tenho de provar aqui a minha nacionalidade, ao que avançarei já para a minha vocação marítima. Descansem, é questão muito simples, adequada ao período estival e a algum alívio que me permitiu, ontem, cumprir a dita vocação. Poderia, eventualmente, abster-me de falar do assunto, por correr o risco de parecer um bicho raro, mas, afinal, já sei que não sou tão raro como isso: entre a praia propriamente dita e uma boa esplanada frente ao mar, tragam-me a esplanada.
Com atraso, dou pela saída da blogosfera do blasfemo CAA, outrora o mouricida CAA. Mesmo sem concordar muitas vezes com eles, sempre tive um gosto especial pelo Mata-Mouros e, depois, pelo Blasfémias, menos neste caso, pois perdeu-se a unanimidade portista. O CAA demonstrou sempre uma atenção muito viva à realidade e um forte desejo de intervenção cívica, podemos até falar de paixão pelas ideias que defende. Não é preciso concordar para que tenhamos essa percepção. Vai fazer falta.
Muitos bloguistas de direita, que,enquanto tal, nada mais são do que isso - bloguistas -, têm sido grosseiros em relação à dirigente socialista Ana Gomes. Os ataques, quase todos, tresandam a machismo e são inconsequentes. Como não concordam com o conteúdo, atacam a forma, isto é, o estilo, isto é, a frontalidade, isto é, a coragem. Pegam nesses ingredientes, amassam-nos bem amassados e inventam um bolo em que a cobertura é feita de adjectivos indelicados. E fazem muito bem, porque, ao fazê-lo, revelam-se. Só a liberdade de expressão permite isso. Certo, para mim, é que quem escreve isto está muito acima desses detractores de meia-tigela.
Vivemos tempos incaracterísticos. Não, este texto não é sobre política. É apenas dedicado à gastronomia. E é curto. Só quero dizer que está a decorrer, uma vez mais, no Porto, o Festival da Francesinha. Nunca lá fui, e creio que voltarei a não o fazer. O patrocínio é da cerveja Sagres, e, apesar de estarmos num país tão pequeno, não gosto nada desta globalização. Francesinha devia ser regada com Super Bock ou Cristal. Noutros tempos, o patrocínio da Sagres não seria possível. Depois, sou fundamentalista nesta matéria. Gosto de comer as ditas nos sítios adequados, as cervejarias. Mais: não existe a francesinha perfeita. Para mim, a melhor seria a da Cufra, com o molho do Chamiço. Está dito.
"Lamentável episódio da vida política portuguesa" - Assim classificou Ferro Rodrigues, ao demitir-se de secretário-geral do PS, a patética actuação do presidente da República. A atitude é digna e, até, corajosa. Alguém esfregará as mãos, mas Jorge Sampaio não terá um sono sossegado. O presidente agravou a crise. Isso é algo que ninguém esquecerá.
Quando votei num presidente da República, estava à espera de um estadista com opinião própria, que a soubesse ter em conta nas poucas ocasiões em que tal lhe é consequentemente permitido. O homem acabou de dizer que não é notário, mas é. Se eu quisesse um simples árbitro, tinha votado em Martins dos Santos, que sempre é portista. Jorge Sampaio, ao ser cúmplice da sinistra tomada do Governo pela dupla Santana/Portas, manchou de forma indelével o seu mandato. Este nunca deveria ser um dia histórico, mas o golpe de Estado que vivemos pode tomar, pela negativa, tal sentido. É um dia triste. Dia de um tempo em que faltam os grandes homens. Um tempo turvo, cinzento.
Na senda do texto anterior, agora com frases roubadas ao Filinto Melo, antes e depois.
"Já me tinha esquecido do prazer que sinto em andar pelo Porto."
=
"Already pleasure had forgotten it to me that I feel in walking for the Port."
Nunca tinha comprado um livro desses que integram as promoções de jornais. Por motivo nenhum em especial, talvez por algum fenómeno semelhante ao que me leva a torcer o nariz aos CDs piratas, porque anulam o prazer do objecto verdadeiro, da real thing. Claro que as tais edições são absolutamente legais, mas falta-lhes qualquer coisa. Não quer isso dizer que eu seja um bibliófilo radical, pois o que me interessa nos livros, em primeiro lugar, é o que neles está escrito. Foi por isso que, outro dia, ao ver no café muita gente com uns calhamaços de capa alaranjada, fiquei curioso e, ao ver que era o "Moby Dick", de Herman Melville, decidi comprar (nunca tinha lido além de extractos, e é uma daquelas aventuras eternas que fazem soar sininhos nas nossas cabeças). Em má hora o fiz. A tradução é do mais bera que há. Um lixo. Reles. A dita promoção era do "Público", mas podia muito bem ser de outro jornal qualquer. Não são os jornais que estão em causa, porque as redacções nada têm a ver com iniciativas de marketing. O problema é que as iniciativas de marketing, tão importantes, actualmente, no negócio da Imprensa, estão a cargo de pessoas que nada têm a ver com jornais.
Repararam no Paulinho das feiras? Parecia estar numa bancada do Estoril Open. Terá sido a primeira vez que foi à bola?
Repararam que a esposa de José Barroso agitava, denotando uma coisa parecida com convicção, uma bandeira das de pagodes?
Eu não ia escrever nada sobre isto, para já, mas as buzinas na rua estão a mexer com o meu sistema nervoso.
Sob o título "Notáveis do Porto apoiam Santana", publica "O Comércio do Porto", em primeira página, uma foto de João Loureiro, Luís Filipe Menezes e Sílvio Cervan. Notável não é o mesmo que politiqueiro. Não é o mesmo que nenhum dos três retratados. Não é aquilo. O Porto sempre teve e terá gente notável, mas não são esses. Ao cabo de 150 anos, "O Comércio do Porto" devia saber isso.
Este é o tempo
Noto que a blogosfera anda desatenta. Pelo menos, ainda não vi qualquer referência à entrevista da ministeriável Cinha Jardim. É o que faz não lerem as publicações de referência deste país, no caso a revista "Correio Mulher", integrada no jornal "Correio da Manhã". Transcrevo a parte que interessa:
Os festejos da qualificação de Portugal justificam que ninguém (ao que parece) tenha ouvido as declarações do presidente da República, após o Portugal-Holanda, mas não explicam que a televisão pública as tenha editado, a posteriori, de modo a que não volte a ouvir-se o que importa. Sobre o futebol, o país é unânime, pelo que não é do júbilo demonstrado que quero falar, mas sim da circunstância de Jorge Sampaio ter dito esperar que a capacidade de mobilização dos portugueses se mantenha, depois do Euro, para outras decisões mais importantes. Às vezes, ouvimos o que queremos ou interpretamos como queremos. Como eu e uma multidão de cidadãos, indignados com a fantochada política que Portugal vive, queremos eleições antecipadas, é natural que se possa ver ali um sinal de que a dissolução da Assembleia da República é, efectivamente, um cenário possível.