Indo ao assunto que me fez escrever o post anterior, noto que o moralizador do costume, a propósito dessa ideia de Luís Filipe Menezes de dotar Portugal de uma nova Constituição, encara-a como eventualmente "positiva", notando que o actual texto "contém muitos bloqueios a uma liberalização do Estado e da sociedade". Tenho para mim que o liberalismo - falo destes liberais que agora saltam de baixo de todas as pedras, não dos teorizadores de antanho ou dos que derrubaram as monarquias absolutas (para garantirem para eles a nobilitação do poder, não se esqueça) - é mero capricho intelectual de uma elite, mais ou menos endinheirada, que já se vê na mó de cima (os que aí não estão também devem acreditar no Pai Natal) e entenderá a pobreza alheia como golpe certeiro dessa mão invisível que o outro pôs a regular o mundo, no remanso escocês de setecentos, ou até de a interpretar na forma ignóbil teorizada por Malthus. Poderei admitir que o Estado, enquanto entidade autofágica de uma nação, poderá necessitar mais da rédea curta dos cidadãos, mas não foi, até agora, encontrada melhor solução para tentar a inatingível harmonia social. Inatingível, claro, porque a natureza humana combate a harmonia, porque a avidez não se compadece com sentimentalismos e porque a solidariedade é um inimigo a abater por essa sacrossanta entidade que é o mercado. Entregar a assistência (na saúde, na pobreza, na aposentação...) aos que apenas procuram o lucro é uma ignomínia, na simples medida em que o desejo do lucro anula todos os restantes valores (e a solidariedade nasce do coração, não da auto-regulação do mercado). E isto passa-se em todas as escalas, da freguesia ao planeta: retirarei o que disse quando alguém me apontar uma companhia cotada em bolsa que queira acabar com os desequilíbrios no Mundo, ou um Estado "liberalizado" que não esteja nas mãos dos agentes económicos.
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