2 comments | segunda-feira, julho 31, 2006

Que sentido faz escrever Qana para pronunciar Cana? Nas fontes anglófonas, lemos com Q, nas francófonas e outras com C.

O qão qavou uma qova no qanteiro.

Adenda: agora também vai aparecer Canaã; Israel e o Líbano disputam a terriola onte terão sido celebradas as Bodas de Canaã, mas isso é daquelas quezílias entre os arqueólogos dos lugares bíblicos que, regra geral, não chegam a lado nenhum: eles querem mostrar serviço, e os países onde operam querem capitalizar o turismo religioso...

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Sendo José Pacheco Pereira uma pessoa inteligente e culta, qualidades que nem me atrevo a contestar, tenho de concluir que há nele uma atitude dolosa sempre que resvala para a opacidade intelectual (se escrevesse "desonestidade intelectual", o dolo seria explícito). Será defeito meu, mas sempre me incomodam as tiradas de moralização dos media que protagoniza, disfarçadas de crítica lúcida e desapaixonada, pois é das pessoas que, em Portugal, melhor se aproveitam da própria mediatização. Pacheco Pereira não existe pelo que dele mostra e faz mostrar, mas, se não o fizesse, não seria Pacheco Pereira, antes um obscuro intelectual, como tantos outros bem mais válidos do que ele. A dissecação semântica que faz da palavra "massacre", que eu mesmo usei para titular, no JN, a notícia do (hélas!...) massacre de Cana, é do mais rebuscado que pode haver. O verbo "massacrar", segundo o dicionário da Porto Editora (tenho-o aqui à mão, mas, quando chegar a casa, vou consultar o da Academia, o Houaiss e o de José Pedro Machado), significa "matar em massa e cruelmente pessoas indefesas; chacinar". Ora, não acredito que uma pessoa com os estofo intelectual de Pacheco Pereira conclua, daí, que massacre pressupõe dolo. Pode resultar de neglicência, que a crueldade mantém-se presente, pois a negligência pressupõe desrespeito pelas vidas de inocentes, atitude em si cruel. As crianças de Cana foram vítimas de uma chacina, e quem diz o contrário não sabe o que diz. Ou sabe, pois diz o que diz com fins, esses sim, meramente propagandísticos. Fá-lo, sempre, com aquela máscara de sobriedade que todos conhecemos. E os tais pataratas, esses que tomam partido, "tout court", aplaudem, como bons acólitos que são.

3 comments | domingo, julho 30, 2006


Cadáveres ensacados na aldeia libanesa de Cana, onde um bombardeamento israelita matou 57 civis. As flores servem de escala para que nos apercebamos do tamanho diminuto de alguns corpos. Crianças. Ou de como o terrorismo de Estado alimenta (e se alimenta de) o terrorismo de pé descalço. Tomar partido, em algo tão desprovido de sentido, é uma imbecilidade.

0 comments | sábado, julho 29, 2006

Foto de POS

(música retirada)

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Foto de POS

Foto de POS

Foto de POS

Foto de POS

O Agostinho Santos, um dos leitores da Fonte da Virtudes que têm o raro privilégio (o raríssimo privilégio) de confrontar pessoalmente o administrador / director / redactor / repórter fotográfico aqui do estabelecimento, veio dizer-me, um dia destes, que eu me andava a baldar com as imagens. Para o calar (ou talvez não), ponho aqui quatro imagens de uma exposição dele, que esteve em Abril e Maio deste ano na galeria municipal de Matosinhos. Era para o ter feito na altura, mas a coisa passou-me...

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Há uma entre várias subespécies, dentro desta a que determinámos pertencer, que me incomoda um pouco: os homens de acção. Aqueles que pensam como os paralelepípedos, em linha recta, com ângulos rectos, com toda essa rectidão de que se mascara a deliberada incapacidade de reflectir. Quando alguém diz que, no Médio Oriente, assistimos ao confronto entre a cultura (Israel, já se vê) e o obscurantismo (esse grande saco do terrorismo em que se metem todos os árabes), vejo-me forçado a identificar esse alguém com as pedras da calçada, cinzeladas com vigor, desenhadas com o fino traço de cortantes arestas. Sólidas. Duras. Imutáveis, porque o tempo efémero de uma vida humana não chega para as erodir. São esses paralelepípedos de nítido corte que, olhando para esta coisa que a todos assusta, decidem desde logo compreendê-la. E tomar partido, coisa própria dos homens de acção. Nem param para pensar por que motivos uma civilização tão avançada, que tanto nos deu, é agora tão obscura. Esse mundo islâmico que determinou o progresso das matemáticas, que nos deu luzes para a navegação, que impediu os grandes clássicos de se perderem para sempre, traduzindo-os para que mais tarde viessem a ser recuperados pelos humanistas. Fixados no papel que lhes atribuiu o destino, elos de firmeza nessa calçada que os tempos pisam, ignoram tudo o que o luminoso Ocidente fez para obscurecer essa infiel gente do Levante. São calhaus, nada mais poderá esperar-se deles.

0 comments | sexta-feira, julho 28, 2006

Foto de POS

...tudo, tudo, tudo, para os liberais, é explicado pelo bendito mercado. Dos teatros às batatas cozidas, da arte à sardinha assada, das pautas aduaneiras às pautas musicais, das patas que grasnam às pitas que piam. Se eles entrassem em saldo, os liberais, determinaria o mercado uma ruptura de stocks? Se alguém os comprasse, claro.

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Com a nota de JPP a que me referi ontem, despertam as consciências de referência para algo que vem sendo denunciado, há muito, muito tempo, na blogosfera e, claro, fora dela (os jornais, sabem?...). Mas pronto, se o homem serve para isso, honra lhe seja.

nota - isso das "consciências de referência" é uma brincadeirinha por causa desse conceito, que teimo em não compreender, de "jornais de referência"; apenas isso.

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Um país de que as pessoas desistem porque delas desistiu.

0 comments | quinta-feira, julho 27, 2006

Pacheco Pereira acordou para o site da Câmara do Porto, porque os escrevinhadores do vomitório decidiram, desta feita, remexer no quintaleco que traz na SIC-Notícias. Fê-lo após cuidadas explicações, como esta pérola de plástico: "Rui Rio é uma enorme raridade na vida política portuguesa e o facto da minha cidade o ter eleito só pode prestigiar o Porto". Mas fê-lo porque lhe mexeram no jardim. Já a irmã se virara contra Rio, a propósito de outro quintal. Ou seja, temos uma família ciosa dos seus canteirinhos, mesmo que não fiquem ali pela Rua de Belomonte.

2 comments | quarta-feira, julho 26, 2006

"(...) Acontece que a cultura é um bem como outro qualquer, com pessoas e entidades que a produzem e com indivíduos que a consomem. Como tal, o seu valor só poderá ser o valor de mercado e não propriamente uma qualquer abstracção determinada por avaliações subjectivas dos políticos (...)"

3 comments | terça-feira, julho 25, 2006

As palavras abandonam-nos. Quantas vezes... Por mais que as procuremos, apenas surgem aqueloutras que não são publicáveis, porque eventualmente ofensivas, porque certamente diminuidoras da elevação que se pretende associada ao debate das coisas públicas. Abandonado pelas palavras, começo a ser incapaz de escrever, respeitando os limites da decência e da urbanidade, sobre as atitudes da entidade que presume ser a Junta de Salvação Municipal. Esta decisão de entregar a gestão do Rivoli a privados é... é... pois, faltam-me as palavras. Não sei o que dizer da atitude (...) de Rio e da (...) da mentalidade que lhe subjaz. Porque gerir um município desta grandeza não é apenas fazer as (...) das contas, porque os eleitores (presumo eu, quiçá inocente) não votaram num (...) de um contabilista. (...) que (...) esta (...)!!... Mas outra coisa não seria de esperar daqueles cérebros (...). Essa (...) da cultura é uma (...) dum negócio como qualquer outro, e tudo se resume ao livrinho do deve e do haver. Ou seja, o cavalheiro lança como único argumento a possibilidade de levar mais gente ao estaminé. Se for para ver as pessegadas do La Féria, assistir às diabruras do palhaço Batatinha ou ao desfile dos Morangos com Açúcar, é certo que aquilo será um êxito permanente de bilheteira. O município, vocacionado para senhorio, recebe a renda e, alegremente, é capaz de atirar aos olhos da opinião pública, com muita areia à mistura, os números de uma decisão acertada. Porque o acerto destes senhores é mensurável, sujeito ao aval de revisores oficiais de contas, escrito em folhas quadriculadas. O acerto é aferido pela prova dos nove, ganha corpo em sucessões alinhadinhas de algarismos sorridentes. Ao município não compete dinamizar a cultura, julgarão eles, e o vazio completo da cidade é a prova de que seguem à risca o que as convicções lhes ordenam. Querem emagrecer as despesas e assim fazem. Mas tinham obrigação de prescindir dos respectivos ordenados e, em paralelo, estipular um valor diário qualquer, que pagariam à cidade, como indemnização pela penumbra em que insistem em mergulhá-la. Nunca tão poucos fizeram tanta (...) para prejudicar tantos.

A decisão está tomada, mas a petição ainda está ao dispor de quem quiser juntar-se ao protesto.

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... mas o filme está longe de encher as medidas, como aconteceu com o primeiro.

1 comments | segunda-feira, julho 24, 2006

Amílcar Paulo era visita diária lá de casa e vice-versa, chegadíssimo amigo do meu Pai. Há muitos anos, no tempo em que as Pessoas eram vivas. Qualquer pessoa que saiba alguma coisa sobre o Judaísmo, em Portugal, ouve o nome desse homem sem indiferença. Cresceu no tempo dos judeus ainda secretos e a esse secretismo se manteve fiel, de algum modo. Mas foi um dos grandes estudiosos dos marranos, desvendou e publicou muitos dos segredos dessa gente (também a gente dele) que (em Trás-os-Montes, em Belmonte...) lhe abriu as portas. Foi um grande amigo de Israel, através dele conheci, ainda miúdo, judeus de todas as paragens. Gente boa, amiga. Um deles - pasmem os ignorantes -, professor universitário e cidadão americano, dos maiores maiores mãos-largas que já conheci. Desde miúdo convivi, de algum modo, com Israel. Desde miúdo aprendi a admirar as coisas boas do Estado de Israel. Mas não levei com um menorah na cabeça, ficando por tal impossibilitado de a utilizar. Se sei ter um olhar crítico em relação aos que acusam Israel de tudo e de nada, o mesmo sucede em relação aos que tomam o partido do Magen de David e rotulam todos os que têm opinião contrária de anti-semitas. Geralmente, são estes os mais intolerantes. Os grossos, os malcriados (um passeiozito pela blogosfera portuguesa é elucidativo). São grossos e malcriados porque são ignorantes. São ignorantes porque só os ignorantes crêem garantidamente que o não são. A História, se alguma coisa nos mostra, é que nada pode resumir-se à existência de bons e maus. E ensina-nos a necessidade do distanciamento, a importância do discernimento. A não ser para os que, na História, apenas escolhem um acontecimento qualquer para marcar o início dos tempos que lhes interessam. Pode ser o holocausto, pode ser o rapto de dois soldados israelitas... Aprenderam, provavelmente, com gente como o animador televisivo José Hermano Saraiva, que vê na História, como li numa entrevista qualquer, o mero testemunho do que se passou. Porém, como assim aprenderam, sempre viverão sem perceber nada do que os rodeia.

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... apraz-me dizer que a imbecilidade portuguesa não sai do debate. Existe uma regra invisível, pela qual ser de esquerda é ser pró-palestiniano e ser de direita é ser pró-israelita, como se não houvesse judeus de esquerda ou árabes de direita, faça isto o pouco sentido que fizer. A complexidade da situação é de tal ordem, que se torna confrangedor ver, em toda a parte, opiniões meramente panfletárias, elas mesmas factores de divisão. Nós somos bons (ler "somos todos palestinianos" ou "somos todos israelitas", conforme uma ou outra se aplique), os gajos são maus, tudo cosido com intrincadas tramas de aparente intelectualização. Nos dois lados da barricada opinativa, vemos que este é um país à medida do simplex. Porque o difícil é ver as coisas sem essa barreira que distingue bons de maus.

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No vazadouro que mantém online, a Câmara Municipal do Porto despeja mais algumas toneladas de sobranceria, a propósito de um trabalho dado à estampa pelo "Público", sobre essa patética montra do poder autista, eleito pela cidade desertificada. Uma montra para a qual, volto a dizê-lo, não faço link. Já aqui escrevi, como tanta gente o fez em tantos locais, que a utilização propagandística do site, um espaço institucional pago com dinheiros públicos, prefigura claro abuso de poder. Como se não bastasse, aquilo é mal escrito, parolo, fastidioso. O uso da ironia não está ao alcance de todos. Claramente, transcende as limitações do banal plumitivo que ali se diverte, sem dar a cara. Responde às críticas, dizendo que delas apenas resultou o aumento do número de visitantes do site. Ignora-as, claro, como teima em não ver que dessa crescente visibilidade do obscuro despotismo mais não resultará do que a solidificação, a cada "page view", do isolamento em que os eleitos locais escolheram viver.

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Cá estou.

0 comments | domingo, julho 16, 2006

Foto de POS
FLUP, 2006

Faz parte da essência desta Fonte, pelo menos em jeito de desculpa de blogueiro, que a água jorre aos soluços, ora caudalosa, ora escassa, umas vezes potável, outras, eventualmente, inquinada. Enfim, inconstante, oscilante, até hesitante. Ao cabo de alguns dias sem postar, creio ser devida uma explicação aos leitores. A razão está, em parte, no edifício da imagem, paradigma portuense da arquitectura psicótica. Nele, ou por causa dele, tenho gasto o tempo e a cabeça, que nem sempre chega para as encomendas (salvo seja). Dentro de dias, voltará a normalidade, o que não quer dizer que não vá escrevendo qualquer coisita nesta vossa casa.

0 comments | terça-feira, julho 11, 2006

Remember when you were young, you shone like the sun.
Shine on you crazy diamond.
Now there's a look in your eyes, like black holes in the sky.
Shine on you crazy diamond.
You were caught on the crossfire of childhood and stardom,
blown on the steel breeze.
Come on you target for faraway laughter,
come on you stranger, you legend, you martyr, and shine!
You reached for the secret too soon, you cried for the moon.
Shine on you crazy diamond.
Threatened by shadows at night, and exposed in the light.
Shine on you crazy diamond.
Well you wore out your welcome with random precision,
rode on the steel breeze.
Come on you raver, you seer of visions,
come on you painter, you piper, you prisoner, and shine!


palavras de Roger Waters para Syd Barrett, morto há dois dias, soube-se hoje, aos 60 anos; das declarações de circunstância, destaco as de David Bowie à BBC: "He was so charismatic and such a startlingly original songwriter. Also, along with Anthony Newley, he was the first guy I'd heard to sing pop or rock with a British accent. His impact on my thinking was enormous. A major regret is that I never got to know him. A diamond indeed."

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Declaro que sou atleta de alta competição em várias modalidades, como a deglutição de leitão. Noutras, como o levantamento do copo, já não alinho em competições oficiais, mas reservo para mim o estatuto de velha glória. Assim, solicito ao Governo isenção de IRS relativamente a quaisquer prémios que venha a receber, ou, na mais que provável ausência destes, ao salário mensal.

É uma vergonha que isto esteja previsto no Código do IRS. Se o Governo aprovar a pretensão do sr. Madail, isentando de impostos estes bacanos que ganham dinheiro como merda (não há outra maneira de o dizer), será a infâmia total.


ACTUALIZAÇÃO: O ministro Teixeira dos Santos já falou sobre o assunto. Falou bem. Fica guardada, porém, a memória deste insulto a todos os portugueses.

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Comparar a Câmara do Porto, enquanto entidade concessora de subsídios, a um patrão, fazendo dos agentes culturais apoiados os empregados que se querem obedientes, é muito errado e perigoso. Na essência, os eleitos com poder executivo não passam de intermediários mandatados pela sociedade. Ou seja, compete-lhes promover a dinamização desta ou daquela actividade, mas não em nome próprio, nem apenas em nome dos que neles votaram. Assim é a democracia. Claro que o sistema pode redundar no favorecimento de clientelas, mas a alternativa, num país embrutecido como o nosso, é o vazio total. Para os liberais, a única liberdade que parece importar é a que mexe com a administração dos próprios tostõezinhos. Assente no indivíduo, nas liberdades individuais, a doutrina pisa a linha de fronteira do egoísmo, causa de todos os males porque intimamente ligado à inveja, à cobiça, ao desprezo pelo outro... Mas a Liberdade é mais do que a livre iniciativa. É, por exemplo, o direito à diferença, a liberdade de contestar sem que as minorias dominantes, que sempre são as mais endinheiradas, espezinhem impunemente as vozes discordantes. O famigerado protocolo que Rui Rio & associados querem impor às instituições subsidiadas é um claro abuso de poder. À uma porque o dinheiro não é deles, às duas porque só serve para oficializar a instrumentalização política da concessão de subsídios, sob uma máscara propagandística de fosca transparência.

2 comments | segunda-feira, julho 10, 2006


Eu não sou de Gaia, mas sei onde fica a Rua da Rasa. Como se não bastasse, sei que aí fica o campo do Vilanovense. Mais: sei de uma história, ali passada, que vem muito a propósito. Ei-la.

O jogo era como qualquer outro, naquele campo acanhado, degradado, antiquado. Um campo alheio ao país dos estádios, distante das grandes noites europeias na tê-vê, mas íntimo das quentes tardes de pelejas secundárias. Era uma partida vulgar, o Vila contra os outros, o árbitro sempre culpado de todos os males, do pecado original ao golo que caiu mal no goto, da peste negra ao negro marcador. Ora, enquanto o jogo decorria, o homem de preto, que talvez vestisse de amarelo, foi filho de beltrana e beltraneja, chifrudo e rabudo. Foi remeloso, manhoso e aleivoso. Das bancadas, despejaram, sobre cada apitadela em desfavor dos da casa, todas as machadadas que o experimentado léxico lhes permitia.

E o juiz, estóico, indiferente ao chasco, surdo aos gritos do palavroso chavascal, apitava o jogo. Falta para lá, palavrão para cá, a psique centrada na missão de impor as leis. As do jogo, lá estavam três polícias para fazer respeitar as outras. Ora, andavam eles nisto quando um bacano qualquer, incógnito num canto da bancada, soltou bem alto o impropério:

_ Ó choninhas!...

Nem apitou. O árbitro esqueceu o jogo, saltou o murete, pulou os degraus quatro a quatro e pespegou valente murraça no impertinente adepto. Limpou a honra.

Mostra-nos esta história que, por vezes, o pior insulto não é o mais obsceno, apenas aquele que, por insondáveis motivos, desperta a fera que o ofendido quis manter adormecida. O homem aguentou tudo, tudo, tudo. Mas "choninhas" é ofensa que não se leva para casa, é ferida profunda, a lavar com sangue. Resolveu a questão ali, sem espinhas, sempre há coisas que um homem não pode permitir.

Ora, parece-me que a mais mediática cabeçada dos últimos tempos tem qualquer coisa a ver com isto. O homem jogou anos em Itália, Lippi conhece-o, os jogadores conhecem-no. Houve ali qualquer coisa que o fez dar meia volta, puxar a culatra atrás e espetar a testa no peito do ofensor. É essa, portanto, a grande dúvida que nos sobra do Mundial da Alemanha: que terá Materazzi dito a Zidane?

0 comments | domingo, julho 09, 2006


Nada como o estádio de Oeiras, santuário da lusa saloiice, para tamanha dose de alienação popular, ao gosto de tantos outros que não vão torrar para as bancadas: os políticos que não são escrutinados e sobem na popularidade; as televisões que fazem longuíssimos directos apoteóticos; os jornais que imprimem apoteóticos diferidos...

O futebol, ao nível da trasladação da irmã Lúcia para Fátima e da inauguração do Campo Pequeno, em que julgo ter havido fado.

0 comments | sexta-feira, julho 07, 2006

Vi o que se segue num blogue espanhol. E dei-me ao trabalho de traduzir, em exclusivo para os leitores da Fonte das Virtudes. Bom proveito!

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  • Em qualquer investigação policial que se preze, é necessário visitar, pelo menos, um clube de strip-tease.
  • A maioria dos cães são imortais.
  • Se alguém te persegue, no centro da cidade, podes sempre escapar-lhe, escondendo-te entre os participantes no desfile do dia de S. Patrício, que é celebrado, indistintamente, em qualquer época do ano.
  • Todas as camas têm um edredão que chega às axilas, no caso das mulheres, e à cintura, no caso dos homens.
  • Todos os sacos de compras de supermercado devem conter, pelo menos, um cacete de pão, que sobressaia um pouco, e são sempre de papel.
  • Todos os números de telefone, nos Estados Unidos, começam por 555.
  • É fácil pilotar um avião e aterrá-lo, se houver alguém na torre de controlo que possa dirigir a operação, via rádio.
  • Uma vez aplicado baton nos lábios, é impossível fazer com que a cor desapareça, mesmo que se faça mergulho em profundidade.
  • Os sistemas de ventilação dos edifícios são o esconderijo ideal: ninguém se lembrará de procurar lá, além de servirem para que uma pessoa se desloque para qualquer parte do edifício sem dificuldades.
  • Se precisas de recarregar a pistola, terás sempre munições suficientes, mesmo que estejas nu.
  • Quando há uma perseguição num mercado e vemos uma banca de melões ou um carrinho de gelados, é certo que serão abalroados por algum dos veículos envolvidos.
  • É muito provável sobreviver a qualquer batalha, excepto quando se comete o erro de mostrar a alguém a foto da namorada.
  • Se alguém precisa de passar por militar alemão, não precisa de saber a língua. Basta, apenas, que fale com aquele sotaque carregado.
  • A Torre Eiffel vê-se de todas as janelas de Paris.
  • Homem que é homem não solta um ai quando leva um valente soco, mas queixa-se quando uma mulher tenta limpar-lhe as feridas.
  • Os comissários da Polícia são quase sempre negros e muito mal humorados.
  • Consegue-se um táxi, mesmo no meio do deserto, num segundo, bastando chamá-lo ou assobiar.
  • Se necessitares de pagar uma corrida de táxi, nunca procures uma nota na carteira. Tira sempre, ao acaso, o dinheiro que tiveres solto no bolso, pois será a quantia exacta.
  • As cozinhas não têm interruptores de luz. Quando se vai à cozinha, durante a noite, há que abrir o frigorífico e aproveitar a luz interior.
  • Em casas assombradas, as mulheres devem sempre averiguar ruídos estranhos envergando roupa interior.
  • Todas as manhãs, as mães cozinham ovos e bacon para a família, mesmo quando o marido e os filhos não têm tempo para os comer.
  • Os automóveis que chocam acabam sempre por explodir, arder ou ambas as coisas, mesmo que não tenham uma gota de combustível.
  • Um fósforo é suficiente para iluminar uma sala do tamanho de um campo de futebol.
  • Mesmo que se desça uma encosta numa estrada em linha recta, é necessário virar o volante para a esquerda e para a direita, a espaços de tempo regulares.
  • As mulheres de cidades e vilas medievais depilavam-se frequentemente, além de terem sempre uma dentição impecável.
  • Não é necessário dizer “olá” ou “adeus”, quando se começa ou termina uma conversa telefónica.
  • Um detective só resolve um caso quando lhe tiram o distintivo.
  • As bombas estão sempre equipadas com relógios , que têm visores com grandes números vermelhos, para que toda a gente saiba quando vão rebentar.
  • O chefe da Polícia destituirá sempre o seu detective preferido, dando-lhe 48 horas para terminar o trabalho.
  • É sempre possível estacionar mesmo em frente ao edifício que se vai visitar. E o carro nunca é rebocado pela Polícia.
  • Pouco importa se, numa luta de artes marciais, os inimigos superam o herói em número, largamente. Atacarão à vez cada um, enquanto observam, em postura agressiva, como os colegas vão sendo eliminados.
  • Se uma pessoa fica inconsciente, após levar uma pancada na cabeça, não sofrerá traumatismos ou lesões cerebrais.
  • A Polícia submete os agentes a rigorosos testes psicotécnicos, para que todos tenham como companheiro de patrulha alguém com uma personalidade diametralmente oposta.
  • Quando estão sozinhos, os estrangeiros preferem falar Inglês entre eles.
  • Não há fechadura que resista, em segundos, a um clip ou a um cartão de crédito, a não ser que seja da unica porta de acesso a uma casa em chamas, com uma criança encurralada lá dentro.
  • Os nomes das cidades latino-americanas começam sempre por “San”.
  • Se alguém conduz um automóvel em sentido proibido, nunca chocará contra os carros e camiões que vêm em sentido contrário.
  • Qualquer polícia ou detective será retirado de um caso importante pelo FBI. Porém, no final, será sempre esse polícia a resolver o caso, ante a total negligência dos agentes do FBI.
  • Há sempre um polícia de trânsito atrás de um cartaz publicitário.
  • Se temos de desctivar um engenho explosivo, será sempre impossível fazê-lo até que faltem cinco segundos para a detonação.
  • Os americanos nunca fecham a posta do carro, mesmo que estejam no bairro mais assustador do Bronx.
  • Qualquer extraterrestre tem sangue verde.
  • Quando alguém chega a casa, depois do trabalho, a primeira coisa que faz é servir-se de whisky no bar da sala. Há sempre, no balde, gelo impecavelmente conservado, que resistiu a toda uma jornada de trabalho.
  • Se, numa porta, há um cartaz em que se leia "zona restrita – só pessoal autorizado", é certo que, mais cedo ou mais tarde, alguém "não autorizado" passará por ela.
  • Os carros circulam sempre entre carris e a distância fixa uns dos outros, para que possam, facilmente, ser ultrapassados em ziguezague.
  • Qualquer objecto que caia na Terra (ovni, meteorito...) acabará sempre por aterrar nos Estados Unidos. Pelo menos, tentará.
  • Nos filmes, a sobrevivência está assegurada para muitos personagens, menos para o amigo do bom, que será assassinado ou sequestrado antes de o filme chegar a meio, para que o herói tenham mais razões para apanhar o mau.
  • Os informadores da Polícia são, maioritariamente, sujeitos de baixa estatura que só podem ser encontrados em bares onde nunca há ninguém.
  • Se és divorciado ou separado, não te preocupes, pois o teu pequeno filho fará com que te reconcilies com a tua antiga parceira, antes do final do filme.
  • Se uma mulher sai de um bar, fá-lo-á pela porta mais distante e escolherá o pior caminho (um beco sem saída, por exemplo), para provocar os malfeitores.
  • Em todos os casamentos há dois filhos: o bom e o mau.
  • Quando se interrompe alguém que está a fazer a barba e este limpa metade da cara com a toalha, não há qualquer diferença entre a parte barbeada e a que não está.
  • Os comandos à distância dos americanos têm botões de molas com encaixes, ao invés de teclas de borracha e membranas do mesmo material, a avaliar pelo ruído que fazem quando são usados.
  • Mesmo depois de ter feito amor durante toda a noite, qualquer um sai da cama com tal vergonha que vai para o quarto de banho enrolado no edredão.
  • Antes de (tentar) matar o herói, o vilão explicar-lhe-á, com todos os detalhes, o plano que idealizou e quais serão os seus próximos movimentos.
  • Em vez de o matar a tiro, o vilão deixa sempre o herói encurralado na mais complexa das situações. Assim, este poderá escapar, além de se rir no momento de abater o mau.
  • Os polícias fazem sempre vigilância enquanto comem donuts.
  • Se uma pessoa está em casa com alguém e discute com essa pessoa, sai sempre, batendo com a porta, deixando lá dentro o estranho e não se importando nada com isso.
  • Os fios dos telefones, nos Estados Unidos, têm um comprimento mínimo de quatro metros.
  • Os amantes norte-americanos (a maioria deles, pelo menos) só sabem demonstrar o amor diante de uma potente lâmpada, para que o marido enganado possa testemunhar tudo da rua, empunhando uma pistola ou uma garrafa de bourbon.
  • Quando, na manhã seguinte, o inspector de homicídios e o delegado do Ministério Público visitam o local de um crime, estão sempre a tomar café em copos de plástico, além de comentarem que trabalham muito, facto que levou a que fossem abandonados pelas respectivas mulheres.
  • Os delegados do Ministério Público são sempre jovens ambiciosos que terminaram o curso de Direito pouco antes, que chegaram ao cargo sem fazer qualquer concurso e que, no final, se perderem o caso, serão destituídos ou demitir-se-ão por uma questão de orgulho [este último caso, impensável no caso do funcionalismo espanhol (n.t. – ou português)].
  • Todas as mulheres da Califórnia pesam menos de 45 quilos.
  • Nas universidades, o capitão da equipa de futebol americano é loiro, musculado, bruto e ignorante. Namora com a principal chefe de claque, muito atraente, loira, mamuda e malvada, sempre enfiada em roupas escassas e provocantes. O protagonista do filme é morenito e tímido, apaixonando-se pela loira, o que leva a que o bruto e respectivos amigos o agridam. No final, percebe que a loira é parvinha, apaixonando-se pela morena inteligente que ninguém conhece e veste sempre camisa e calças de ganga. (Há ocasiões, como quando se veste para ir ao baile de finalistas, em que percebemos que também é boa).
  • A primeira pista de qualquer bom detective americano é uma carteira de fósforos, na qual está inscrita a morada de um qualquer boteco mal frequentado.
  • Não há nenhuma mulher grávida, envolvida na acção, que não dê à luz antes de o filme chegar ao fim.
  • Independente das vezes que o bom diga a uma mulher para esperar no carro, mal ouça um tiro, sairá disparada ao encontro dele.
  • Todos os mafiosos são estrangeiros ou descendentes directos de estrangeiros.
  • Quando o herói é ferido e está internado num hospital, jamais é visitado pelos pais e irmãos.
  • Os noticiários da televisão dão sempre uma notícia relacionada directamente com determinado personagem, no momento em que este está a ver.
  • Num bar americano, basta proferir a frase “dá-me um copo” para que o barman nos sirva exactamente aquilo que queremos.
  • Invariavelmente, quando o protagonista encontra a mulher, filha ou amigo assassinados, agarra na arma do crime e mancha-se com sangue, para que possa ser suspeito.
  • Todos os alunos problemáticos, em qualquer escola, são hispânicos ou afro-americanos.
  • Determina a lei dos bares que quando alguém pede uma bebida deve dar apenas um pequeno gole, deixando ficar o resto.
  • Nos Estados Unidos existe um tipo específico de fita adesiva, concebida especialmente para amordaçar os reféns. É facilmente identificável, no supermercado, por ser prateada.

0 comments | quinta-feira, julho 06, 2006



("The Piano", filme de Aidan Gibbons sobre o tema "Comptine d'un autre été", de Yann Tiersen, retirado da banda sonora de "Le fabuleux destin d'Amélie Poulain")

0 comments | quarta-feira, julho 05, 2006

Portugal nunca poderia chegar à final: a Senhora do Caravaggio é italiana.

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_ Ide, ide, que a vossa mãe disse que ísseis!...

(e nós fomos)

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Fez três anos, na passada segunda-feira, que abri o Cerco do Porto, blogue continuado nesta fonte mais ou menos virtuosa, ao sabor do tempo e da disposição. Com quarenta e oito horas de atraso, aqui fica o meu abraço de agradecimento a todos os que, passando por aqui, a isto dão sentido.

* com o subentendido pedido de desculpa aos excelsos leitores

0 comments | domingo, julho 02, 2006


Não estive contra o Brasil nem tinha qualquer predilecção quanto ao nosso adversário na meia-final. Os argentinos odeiam os brasileiros e os brasileiros odeiam os argentinos, coisa que vem do período colonial, quando portugueses e espanhóis andavam às turras por causa de um território que acabou, já depois da independência brasileira, por ser transformado no Uruguai, um estado-tampão para não chatear ninguém (que, apesar de tudo, está muito mais ligado à Argentina). Mas isso não vem para o caso. Esta primeira página (podem clicar para ampliar um pouco) pode não ser um exemplo daquilo que deve ser feito, a colocar em compêndios, mas diz muito do humor, das rivalidades e do jornalismo que se praticam naquelas paragens. Além do bem visível trocadilho da manchete, chamo a atenção para a legenda da foto, no canto inferior esquerdo: "Zidane estará pensando: como me rio de Janeiro".

Nota: estes argentinos apontam em todas as direcções; é sabido que também detestam os ingleses, e aquele "Fuera piratas!", no cimo da página, não engana ninguém; só não me agrada a gratidão excessiva aos franceses, que redundou no claro exagero de lhes desejarem boa sorte para a meia-final...