1 comments | segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Em confronto com a clareza da pergunta do referendo temos, aqui e ali, um turvo véu de dúvidas erguido por defensores do "não", com destaque para Marcelo Rebelo de Sousa, que nada tem de burro, pelo que, a meu ver, usa generosa dose de doce veneno nas suas intervenções (ou não fosse ele o primeiro causador desta salgalhada de levar às urnas uma questão que a Assembleia da República tem competência e legitimidade para resolver). Poucos lerão o que aqui se escreve, mas sinto-me obrigado a insistir nestes assuntos, justificando o meu sentido de voto. Um sentido que está, todo, na pergunta.

"Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez,..." - SIM, concordo, porque é uma ignomínia ter uma lei que persegue as mulheres, por terem tomado uma decisão duríssima - "... se realizada, por opção da mulher,..." - SIM, porque, embora o ideal seja que a mulher não esteja sozinha e deva haver co-responsabilização do progenitor, a vontade da mulher tem de ser salvaguardada, para combater a coacção a que possa ser sujeita - "...nas primeiras dez semanas,..." - SIM, porque uma lei tem traçar limites (os juristas saberão desses imperativos formais) e esse prazo, inferior ao praticado noutros países, é tido como razoável por muitos especialistas abalizados - "...em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?" - SIM, porque, para combater o aborto clandestino, como já aqui escrevi, há que torná-lo desnecessário; sem esta ressalva, estar-se-ia, de certo modo, a aplaudir a vergonha de vão de escada, que o "não" implicitamente apoia.

Isto parece-me tão claro que, quando ouço os argumentos demagógicos que por aí andam, tendo a impacientar-me. Porque vejo mais crueldade (em nome de jogos de poder, políticos ou religiosos) do que burrice.

Contrariamente ao que por aí se ouve, o aborto despenalizado e regulamentado será tão livre como o é agora. Porque não há leis que determinem a intimidade, e a mulher que decide avançar, em sofrimento e circunstâncias extremas, fá-lo-á. Claro que deverá haver aconselhamento, claro que as estruturas de saúde não podem ser um self-service de interrupções de gravidez, tal como não podem decidir, devendo haver um prazo curto (fala-se em dois dias) entre o aconselhamento e a decisão definitiva. Certo é que, no momento em que a mulher decidir mesmo, fá-lo-á. No domingo, decidiremos se queremos que continue a ser possível que o faça em condições degradantes. Decidiremos se uma sociedade justa é a que temos, empurrando para a morte mulheres mergulhadas em desespero.

Neste pequeno capítulo da nossa organização social que seremos chamados a decidir, votar SIM é, a meu ver, a única forma de progresso.

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1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

glomp[1]

22:08

 

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