2 comments | domingo, novembro 05, 2006

O blogue A Baixa do Porto tem, entre muitos outros, o mérito de constituir um bom indicador das formas de pensar a cidade, aberto que está a todas as tendências, opiniões, ideologias e por aí fora. Ao passar por lá há pouco, desejoso de ver as reacções à medida de Rui Rio aflorada no post anterior, dei de caras com alguns equívocos, entre eles um que me faz particular espécie: o conceito de sociedade civil.

Diz o Tiago Azevedo Fernandes, meritório dinamizador desse espaço, que "é a sociedade civil que tem de resolver os seus problemas, até porque da Administração Pública já não há muito a esperar". Ora, uma das características que melhor diferenciam a humana espécie, no seio da Criação, é a capacidade de complicar. Ou seja, estaríamos bem servidos se nos limitássemos a destrinçar entre civis e militares, mas há que ir sempre acrescentando elementos (simples ruído, tantas vezes) à nossa conceptualização, o que leva ao aparecimento de coisas que toda a gente aceita, mesmo sem saber o que significam, como a bendita "sociedade civil". Esse conceito é errado, neste contexto, porque o contraponto ao poder público é a iniciativa privada, não a "sociedade civil" (anónima? por quotas? cotada em bolsa?...). Mais errado ainda, muito mais errado ainda, sublinho, porque os poderes eleitos são a dita sociedade civil. São, insisto, servidores de toda a sociedade que os elegeu, entendendo-se aí os que neles e contra eles votaram.

O Tiago fala em "Administração Pública", mas os titulares de órgãos políticos não fazem parte da Administração Pública. Tutelam-na, é certo, mas são muito mais do que isso. Ao alimentar a tese de que a dita "sociedade civil" tem de tomar em mãos as tarefas em que a dita "Administração Pública" falha, está a aceitar, implicitamente, que Rui Rio faz muito bem em querer ser um mero gestor. Ora, isto põe em causa toda a natureza do nosso sistema político, na medida em que o eleitorado, grosso modo, nada sabe de gestão, pelo que seria de melhor juízo contratar presidentes de câmara, ao invés de os eleger.

Os apoios (chamem-lhes subsídios, se querem alinhar nessa ideia de que toda a gente que faz algo só sabe andar de mão estendida) fazem parte das competências que o conjunto dos cidadãos delega nos eleitos, sejam locais ou nacionais. Os favorecimentos de clientelas ou a corrupção são problemas laterais, que têm de ser combatidos com seriedade e competência. Cortar o mal pela raiz, acabando com os subsídios (e não estamos a falar apenas de actividades culturais, que, pelos vistos, são vistas como inúteis por muita gente), não é mais do que a assunção da própria incompetência.

Rui Rio admitiu, portanto, que é incompetente. Nada que não soubéssemos.

2 Comments:

Blogger AM said...

Caro POS

Não podia estar mais de acordo com este seu "post".

De facto este discurso da "sociedade civil", com todos os equívocos que transporta (ou que pretende criar) não faz qualquer sentido, por muito que se "não cansem de o repetir".


Se, como defendem essas correntes, a função da autarquia será pouco diferente da de "gestor de condomínio" então, na realidade mais vale contratar uma equipa de profissionais competentes.

Apenas um reparo final:
Não é verdade "O blogue A Baixa do Porto tem, entre muitos outros, o mérito de constituir um bom indicador das formas de pensar a cidade, aberto que está a todas as tendências, opiniões, ideologias e por aí fora"

Essa é a imagem que o Tiago conseguiu criar (e fez muito bem) mas o facto é que o Rui Rio também conseguiu fazer passar a imagem que é sério....

AM

09:48

 
Anonymous Anónimo said...

De tal modo a sociedade civil é importante que devia fazer-se isto...

08:58

 

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