0 comments | sexta-feira, julho 06, 2007

Desculpem a insistência os leitores que não querem saber destas coisas dos jornalistas, mas creio que se justifica, atendendo ao arraial que por aí vai em torno do "latecomer" MIL.


Fazer parte de uma ordem profissional, suponho, deve ser visto por muita gente como algo com sainete, e é essa emplumada importância que muita gente procura na vida, relegando para o dia de S. Nunca (não precisemos a hora) a busca de uma vida propriamente dita. Querer uma ordem, para muitos, será isso, para muitos outros será o prosseguimento de uma cruzada para derrubar o Sindicato dos Jornalistas (SJ). Ou seja, querem fazer a revolução por fora, desinteressados que estão de a fazer por dentro, como o demonstra a envergonhada taxa de participação nas recentes eleições para os corpos gerentes do sindicato, que permitiram a incontornável consagração de uma lista plantada sob a letra U, querer-se-ia de "unitária", mas, afinal, de "única". A propósito, é curioso verificar como vários nomes coincidem nas petições promovidas pelo SJ e pelo "Movimento Informação é Liberdade", algo que pode indiciar mudanças de opinião (só os burros não o fazem), deficiências na leitura de intenções (fica mal aos jornalistas) ou ligeireza (embora os dois campos lutem contra o mesmo diploma, são rigorosamente distintos).


Tendo eu subscrito o abaixo-assinado do SJ e não vendo vantagens na criação de uma ordem, é evidente que não posso associar o meu nome ao MIL. Mas isso não tem de significar qualquer tipo de fidelidade ao poder que se perpetua no SJ, porque, entenderão, não aprecio a perpetuação dos poderes. Agora, tenho de reconhecer que o SJ actuou atempadamente (haja ou não deficiências no pacote reivindicativo apresentado), enquanto o MIL representa, a meu ver, o aproveitamento do facto consumado para promover uma ideia de auto-regulação policiadora.


Não há que eludir a realidade, a deontologia jornalística não pode ser encarada da mesma forma que a dos médicos ou a dos advogados, porque se trata de uma actividade que pode estar sujeita a outros tipo de pressões, decorrentes dos vínculos profissionais ou da precariedade destes (um médico, mesmo que seja funcionário público, não muda um diagnóstico por determinação ministerial...). Ou seja, sempre no esforço de cumprimento da deontologia, o jornalista responde a uma estrutura hierárquica, aos tribunais comuns e, acima de tudo, aos leitores, ouvintes ou telespectadores. Uma estrutura de pares criada para vigiar, disciplinar, enfim, para controlar a classe será, por um lado, difícil de aceitar pelos poderes já existentes. Mas poderá também, por outro, ser mera estrutura de legitimação desses mesmos poderes, que também nessa estrutura poderão estar instalados. E isto é apenas uma questão orgânica, não se trata de dizer que uns são bons e outros são maus.


Que o Sindicato dos Jornalistas transcenda, muitas vezes, as atribuições clássicas, digamos, de uma associação sindical não me aquece nem me arrefece. Pareceres deontológicos são meros indicadores, tenho o direito de os interpretar, de os avaliar, de os ignorar ou, até, de embrulhar peixe com eles. Sendo que o Código Deontológico é reconhecido pelas leis da República, há organismos encarregados de os ter em conta, quando for caso disso. Já os pareceres vinculativos emanados de uma ordem de jornalistas não me agradam. Porque sei como muitos jornalistas funcionam, porque este é um campo dado como poucos à subjectividade, porque os problemas (e os erros) do jornalismo português não assentam, em exclusivo, nos ombros dos jornalistas.


Existe aqui um problema político. De aperto do cerco por parte do poder político. Porquê? Porque, por vezes, é mais fácil atacar os problemas onde há fragilidades, ao invés de os combater onde realmente existem. E tudo isto passa pela Justiça, ou, no caso, ao largo da Justiça.