6 comments | quarta-feira, novembro 15, 2006

Já foi aprovada, pelo Tribunal Constitucional, a pergunta. É a mesma de 1998: "Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?".

Há tempos, já deixei aqui explicado que voto Sim. Faltou-me dizer, como o faço agora, que a Assembleia da República teria absoluta competência para legislar nesta matéria. Não estou aqui a colar a quaisquer discursos partidários, é mesmo isso que penso. Da outra vez, António Guterres escorregou (escorregou com o gosto da própria ortodoxia católica, pelo que não foi propriamente uma escorregadela) na casca de banana lançada por Marcelo Rebelo de Sousa. O resultado não foi vinculativo. A escolha de José Sócrates - dar ao povo a liberdade de querer agora o que então não quis - é a que qualquer político faria. Parece-me que, mais do que por convicção relativa ao funcionamento da democracia e das instituições, escolhe a alternativa que, dê para onde der, não comprometerá em futuros escrutínios eleitorais.

Corremos um sério risco de que tudo fique na mesma. Além de outros factores de manipulação da vontade popular, com a acção da Igreja à cabeça, a pergunta deixa muitas dúvidas. Num país em que a iliteracia impera (tenho uma cada vez maior noção desse triste facto), não faltará quem, ao pensar que está errado mandar mulheres para a cadeia, não concorde com isso da "despenalização"...

A propósito de perguntas e respostas, há anos, ao entrevistar um dos mais mediáticos padres portugueses, que não padece de tais limitações interpretativas, também lhe lancei uma interrogação manhosa:

_ Confunde despenalização do aborto com liberalização do aborto?

_ Não confundo. Não confundo... _ respondeu, abanando a cabeça e lançando ao chão um olhar de tímida vergonha.

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6 Comments:

Blogger Jorge Simões said...

Eu votei sim da primeira vez (quando muito pouca gente votou) e vou votar não desta vez.
Explico porquê...
- Por razões menores e egoístas que assumo: voto contra tudo o que for defendido pelo governo da Socratina.
- Por razões maiores e não egoístas: já tive oportunidade de verificar, através de ecografias, que uma criança de nove/dez semanas está mesmo bastante formada e com grande mobilidade.
Espero que o PP e a igreja falem o menos possível porque quando o fazem têm um discurso que não toca no essencial e não fazem senão meter a pata na poça.

De resto, perguntem-me se as mulheres devem ir presas pelo crime de aborto até às dez semanas e aí direi não.

18:17

 
Blogger POS said...

Vou apenas comentar o que escreveste num ponto, sem querer encetar qualquer polémica, pois não sairíamos daqui. Quando escreves "De resto, perguntem-me se as mulheres devem ir presas pelo crime de aborto até às dez semanas e aí direi não.", estás a responder sim à pergunta ("Concorda com a despenalização...?"). Logo, o voto "não" é sinal de incoerência, pois não há outra forma de impedir a condenação de mulheres além da modificação da lei. Não cumprir a lei, sistematicamente, transformar-nos-ia numa república das bananas.

18:41

 
Blogger Joana said...

Eu acho que a campanha quer do sim, quer do nao esta a ser o nojo demagogico do costume. Estou um bocado farta da mania de conotar o nao com a igreja catolica e o sim com o ataque aos valores tradicionais e a familia e as criancinhas.Tambem estou doente de ouvir o argumento miserabilista das pobres coitadas que nao tem acesso a pilula e preservativo e sao analfabetas, bla bla bla ... se for assim vao teracesso a requerer uma IVG num hospital?
Nao tenho grandes problemas em aceitar a liberalizacao do aborto antes das 8 semanas-mas a partir dessa data tenho os mesmos problemas de cosnciencia do Mastermind-o feto reage a estimulos e tem um sistema nervoso funcional, mesmo sem ter consciencia provavelmente sente dor e e morto de uma forma violentissima.Tambem posso acrescentar que tive que interromper uma gravidez nao viavel e que o processo deixa sequelas fisicas e sobretudo emocionais muito profundas.
Acho que a maioria dos portugueses e contra a liberalizacao,mas tambem nao aceita a criminalizacao das mulheres-e que a grande abstencao nos referendos e sinal disso

18:47

 
Blogger POS said...

Pelo que a Joana diz, justamente, há que ter muito cuidado com os juízos que se fazem.

E - sejamos claros -, dos dois votos possíveis (excluam-se brancos e nulos), o não é, claramente, um julgamente de todas as mulheres, ou casais, que o tenham feito ou possam vir a fazê-lo. O sim respeita o sofrimento, a intimidade, a individualidade e as convicções de todos, conquanto tenhamos como assente que as pessoas se distinguem pela capacidade de racionalização, de ponderação, de escolha. E tantas vezes as escolhas são dolorosas!...

Este tipo de discussão, embora não o pareça, é uma devassa da intimidade alheia e uma crueldade. Também por isso, o referendo é um mau caminho, mas é o caminho que temos.

19:02

 
Blogger Jorge Simões said...

Estou de acordo com tudo o que a Joana afirmou. De resto, acho que a pergunta volta a ser a pergunta errada e não quero admitir (embora esteja cheio de exemplos de que, na verdade, assim é) que os gajitos não se saibam exprimir.
Por isso, repito: despenalização? Ok. Aborto livre nos hospitais até às dez semanas de gravidez? Não. Só têm que me fazer as perguntas correctamente (de preferência não a corja que lá está) e, então, veremos...

19:10

 
Blogger POS said...

To whom it may concern:

Agradeço que não transformem a caixa de comentários num fórum de discussão. Não tenho vocação nem vontade de promover o debate sobre o assunto, limitei-me a expressar a minha opinião. Isto não é censura nem coisa que se pareça, como deixei claro em anteriores reflexões sobre o assunto e, neste caso específico, no meu comentário anterior. E peço-te, MasterMinder, que não uses aqui esses qualificativos em relação ao Governo ou a quem quer que seja, por mais que eu possa entender o teu ponto de vista. A liberdade da blogosfera não nos desobriga das normas mais elementares da civilidade. Pelo menos, no meu blogue.

19:24

 

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