Não vi reacções, na blogosfera portuense, à negociata finalmente levada a cabo por Rui Rio, que resulta na transformação do Palácio do Freixo em Pousada de Portugal. Legitimado pela maioria absoluta, pôde vingar, agora, as vezes em que tal projecto foi chumbado pelo executivo camarário. É uma negociata triste, indiciadora de que, para quem governa a cidade, os fins justificam os meios.
Quero clarificar que sou fã das pousadas e, também, das pousadas históricas. Muitos monumentos portugueses estão em bom estado, visitáveis, porque foram recuperados para esse efeito. Neste caso, a coisa é um bocado diferente. Foi a cidade que, há anos, recuperou o edifício de Nasoni, que agora vai ser entregue de mão beijada para que, juntando-se o bloco das antigas Moagens Harmonia, seja montada no Porto a maior de todas as pousadas portuguesas.
Ora, o senhor presidente da Câmara Municipal precisava de dar utilidade ao edifício, na posse do município, mas não soube o que haveria de lhe fazer. Ou não quis saber. Para pôr aquela zona apta a receber turistas, dois museus vão ser desmontados e deslocados: o Museu da Ciência e da Indústria e o Museu Nacional da Imprensa. Ora, estamos a falar do Porto, onde a ideia de "museu da cidade" implica (mal, a meu ver) espaços diferenciados, dispersos. Núcleos que supostamente se integram nesse todo, mas que não passam de tijolos deslavados de um edifício invisível. A cidade merece um verdadeiro museu, baseado em conceitos modernos de museologia, evidentemente centrado num local específico, que constitua uma memória perene nos visitantes. A minha primeira escolha, para esse efeito, era, claro, o edifício da Alfândega Nova, recuperado para a realização de uma cimeira e para o qual não acharam melhor aplicação do que Museu dos Transportes e Comunicações, com todo o respeito que as comunicações e os transportes me merecem. Mas este espaço em que se inclui o Palácio do Freixo seria, também, uma opção interessante para o Museu da Cidade. Não tão boa, porque está bastante deslocado do centro, mas claramente adequada. Parte do esforço público, a recuperação do edifício barroco, já tinha sido feita, pelo que era expectável que fosse destinado a utilização pública.
O Porto merece, com toda a certeza, uma pousada. E em espaço histórico, com certeza. Por que razão não insistiu a cidade numa ideia de que há anos se falava (excelente ideia, digo eu), a de recuperar o Convento de Monchique para acolher tão importante empreendimento hoteleiro? Os exploradores do equipamento davam à cidade uma contrapartida válida (a recuperação de património) os turistas ficavam bem servidos, dentro do centro histórico, e poderiam, até, gabar-se de ter dormido ali, onde a Teresa do "Amor de Perdição" terminou a passagem por este mundo. Claro que essa ideia não avançou. Lá saberão os senhores importantes e iluminados por que assim foi.
7 Comments:
Também sempre achei esta ideia da pousada um pouco estranha, tal como a deriva que a CMP sempre mostrou na invenção de usos para o espaço - desde sede da JMP, a sede de concelho de ministros, a residência oficial do governo (ou do presidente, não me recordo) no Norte, a palco de eventos publicitários, etc. Parece que o grupo Pestana acabou por tirar um peso de cima do presidente da CMP. Só não estou totalmente de acordo com o meu amigo POS na predileção para o local do museu da cidade. A meu ver seria um excelente pretexto para realizar o projecto do Siza Vieira para a Avenida da Ponte, acabando com mais essa ferida na cidade e construindo de raiz um museu contemporâneo que celebrasse a nossa urbe.
23:04
Não poderá concordar mais com este post ! well done
23:08
Caro Patchouly,
Como não sou arquitecto e tenho uma ligeira ligação às coisas da história, preferia que o próprio edifício fosse identidade. Nesse particular, atendendo a que o Porto se fez, em grande medida, do rio e do trato, acredito mesmo que a Alfândega Nova era o sítio ideal, conquanto os arquitectos pudessem trabalhar para a transformar, também, em espaço contemporâneo que celebrasse a cidade. Seja como for, era necessário que os responsáveis políticos acertassem, finalmente, num conceito de museu da cidade, substituindo esse disparate do somatório de pequenos núcleos dispersos. E, claro, que haja soluções para a "avenida da ponte"!
17:43
Sou, por princípio, a favor da ocupação de edifícios históricos, até como forma de não deixar que se degradem. Mais ainda quando tal é possível com projectos auto-suficientes. No caso do Palácio do Freixo, contudo, estou plenamente de acordo com o post, porque o investimento está feito e a CMP só tinha que o rentabilizar. Ao que parece, faltam ideias e sobram amigos na CMP.
Plenamente de acordo quanto ao edifício da Alfândega.
00:42
Caro POS,
estou de pleno acordo com... a decisão de fazerem do Palácio do Freixo e Fábrica de Moagem uma Pousada de Luxo! Nem todos podemos ter a mesma opinião;)
Um abraço
Pedro
00:05
Eu gostava era de ver aquilo transformado numa casa de tias! A frequência e a rendibilidade dos espaços ficavam garantidas, e a identidade política local totalmente preservada!
13:06
Cara Flores e Abelhas,
Soubesse eu sintetizar a questão com tal agudeza, talvez me dedicasse à escrita...
16:19
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