1 comments | segunda-feira, maio 16, 2005

Tolo sou eu, que teimo em surpreender-me com a televisão e, ainda por cima, em pensar que isso é importante, pois a caixa hipnótica é, nos dias que correm, factor-chave na formação dos cidadãos, pequenos e grandes.

Chego a casa, ligo a maquineta e vejo que a RTP transmite aquela macaquice dos Laureus, algo a que chamam “óscares do desporto” sem qualquer cabimento, pois a importância é praticamente nenhuma, ao contrário dos prémios da indústria cinematográfica. Nesse momento, um repórter tem ao lado Jackie Chan e pede-lhe, já não sei com que palavras, para fazer em directo algumas das habilidades que faz nos filmes.

Somos um país de parolos. A televisão mostra-o.

Vários profissionais da estação pública estavam destacados para o tapete vermelho posto à entrada do Casino Estoril, claramente a apanhar os restos de uma produção americana que cá vem por causa do sol, da comida e de umas quaisquer contrapartidas que pouco importam. Passavam a palavra de uns para outros, todos sem nada para dizer além de “Morgan Freeman ainda aqui não passou”, ou trocar uma série de palavras tontas com alguns desportistas, até que um se saiu com a pérola costumeira a respeito do próprio trabalho (cito de cor, só para dar uma ideia): “A segurança está apertada, e esta porta é o sítio até onde deixam ir os jornalistas”.

Jornalismo é uma coisa importante, que devia ser elevada, mas as lógicas comerciais transformam-no cada vez mais numa espécie de entretenimento. É claro que os profissionais da RTP ali postos eram jornalistas a cumprir ordens. Mas creio que podiam ter mais um pouco de juízo e não desbaratar o designativo da profissão em momentos destes, em que são obrigados a protagonizar tontarias em directo (talvez julguem estar a fazer um grande serviço e, aí, o caso é ainda mais sério...). É que, de tanta autopromoção típica dos directos televisivos – “os jornalistas isto, os jornalistas aquilo, não deixam trabalhar os jornalistas nem jogar o Mantorras...” –, o público convence-se, inevitavelmente, de que jornalista é sinónimo de sujeito que anda de microfone em punho ao sabor dos caprichos de terceiros, mais ou menos célebres, isto é, verdadeiramente notórios ou ocos como os da quinta da TVI e afins.

Depois, havia o rei de Espanha, que também lá esteve, talvez para que os americanos se convençam, em definitivo, de que estamos sob a tutela de Madrid. Porque o repórter da RTP já não tem dúvidas. O que nós vimos no televisor foi o monarca, cumprindo as normas protocolares, a dar a primazia a Maria José Ritta, que, em representação do presidente da República, era a dona da casa. Porém, o pé-de-microfone que ouvíamos falou sempre na “comitiva do rei de Espanha”.

Já agora, continuando a falar em jornalistas, o Telejornal começou logo a seguir, enfatizando as más notícias dadas pelo governador do Banco de Portugal, a propósito do défice. Seguiu-se o comentário, um diálogo entre José Rodrigues dos Santos e Sérgio Figueiredo, dois jornalistas que, como todos imaginarão, ganham infinitamente mais do que a média dos restantes em Portugal. Ora, o director do “Jornal de Negócios”, que tem todos os tiques dos jornalistas especializados em Economia, não tem pudor nenhum em dizer que, passando a solução pelo aumento da receita e pela diminuição da despesa, os sacrifícios, em matéria de poupança pública, terão de ser feitos à custa de sacrifício das políticas sociais. Pelo que notei atrás, compreende-se, já que o abrilhantado colunista está a salvo, se não for homem de muitos excessos, dos apertos vividos pela multidão de portugueses que vivem em asfixia financeira.


P.S. – Ainda sobre os Laureus, e para se ver que aquilo é uma palhaçada sem interesse: a Grécia, que ganhou o Euro/2004 a jogar antifutebol (sem retirar o mérito de um objectivo conquistado), arrebatou o prémio de “melhor equipa”, batendo o F. C. Porto. Aqui nem é a clubite a falar. É a mera constatação de que estes prémios não são coisa séria.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

mas este país é para levar a sério?
por agora não

19:08

 

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